terça-feira, 25 de agosto de 2009

Deve-me sua cabeça

O que saí da sua boca, por onde entra?

Pedi-lhe a cabeça, o que me deste? a boca. Boca não é cabeça, não que não deseje a boca, desejo! a boca, língua, saliva. Mas cabeça é algo mais vasto, tem cabelos, olhos, nariz, orelhas e boca também, enfim deu-me apenas a boca. Não chega a ser boca, é apenas a arcada dentária. Quando me presenteou, pensei: só falta falar! não falta mais, já fala, diz coisas absurdas, fala sobre os bolinhos de marte, diz que tem um jardim de margaridas anãs, eu lhe falo sobre a Liga dos AnarcoFascitas Cegos, Ela diz que gosta de Alvares de Campos por ser visceral, Eu falo sobre Caeiro pensando em Satie, juntos dançamos pela casa, levo você à janela, juntos olhamos a chuva cair, cai bem fraca, no horizonte parece que o céu evapora sobre a cidade, na Augusta carros descem, sobem. Pessoas caminham retraídas por causa do frio e da chuva fina. Um skat desce a Augusta, sobre o skat um jovem de cabelos longos e braços abertos, seu corpo se curva sobre o skat e ele desce em ziguezague de braços abertos Augusta abaixo, lá embaixo mal se vê a bandeira sobre o prédio do ex-banespa sacudindo ao vento. Eu, aqui encima, com a boca na mão olhando a cidade. Boca não vê, apenas fala, passo o resto da tarde ouvindo a boca falar, cantar, sorrir.

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