sexta-feira, 28 de agosto de 2009

E a boca falou: Eu sou...


Manhã tranquila, a boca em pleno silêncio durante horas. Silêncio quebrado, uma sentença curta e audíveo: "Eu sou Madame Butterfly", desde então ela passou a se autonomear assim, Madame Butterfly. Passou o resto do dia a se fazer perguntar e dar respostas ou quase isso.

Nada tenha em suas casas cujas utilidades desconheça ou cuja beleza não acredite!

Lembre-se de que um quadro, antes de ser um nu, uma anedota, ou qualquer outra coisa, é essencialmente uma superfície plana coberta de cores dispostas em uma certa ordem?!

As cores se tornaram cargas de dinamite. Elas deveriam explodir em luzes. Tudo poderia ser elevado acima do real?!

Todo aquele que, com integridade e autenticidade, transmite aquilo que o impulsiona à criação, pertence a nós!?

O que precisamos de fato é de uma arte que exprima o espírito das pessoas de hoje?!

A verdade está além de qualquer realismo e a aparência das coisas não deveria ser confundida com sua essência!?

Declaramos que os gênios de nossos dias são: calça, paletó, espetáculos, bondes, ônibus, aeroplanos, estradas de ferro, navios magníficos - que encanto!

O bom é que não se consegue e provavelmente não se deve entender?!



Tela: Beijo Roubado - Otavio Bitencourt

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Eu é que sei




A boca logo cedo sussurrava uma refrão: "Eu é que sei!", "Only this and nothing more". Eu lhe pergunto: É só isso e nada mais? Vejo uma duzia de ratos alados cruzarem a janela e pousarem sobre o casarão de 1913, em ruínas! é uma prova que a lei da gravidade nem sempre é exata.





Eu é que sei

Não sorria para mim, imbecil.
Não necessito do sorriso desbotado dessa
sua cara de palhaço sem emprego.
Não precisa viver se enganando
nem tentar me fazer viver enganado também.
Eu é que sei o quanto são boas as suas
intensões. Mas em que
o consolo de um infeliz desconsolado
poderia me ser útil?
Eu é que sei!
Eu é que sei deste nó carioca do caralho
dado em minha garganta!
Eu é que sei, tá!
Eu é que sei desta dor filha da puta que
esgarça os esparadrapos e futuca
meus machucados que nunca saram!
Eu é que sei, porra!!!
Eu é que sei o quanto as ratazanas
desse imenso esgoto
me roem roem roem roem roem
Eu é que sei!
Eu é que sei, por saber das coisas que me
fazem mal,
o que fará bem - ou não - pra mim!
Somente eu, eu é que sei o que preciso
pra ficar legal!
E o que eu preciso... o que eu preciso,
enfim...
Preciso da solidão,
Companheira nas agitadas e imundas ruas
dessa cidade.
Preciso é da alegria suicida
de cada pingo que pinga pungente
dessa chuva tão fria...
de água ardente!
Preciso é de um porre da confortante e mel-
odiosa música depressiva de Bauhaus!

A boca só parou de falar quando o texto chegou ao fim, de quando em quando ainda a ouço sussurrar: "Eu é que sei", pergunto de boca aberta de quem é o texto, a boca de boca fechada sorri, Luciano Dias Soares, como ele mesmo diz: "escreve pelo prazer de manipular a palavra e ter o que dizer".

Tela: HD Expressionista

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Deve-me sua cabeça

O que saí da sua boca, por onde entra?

Pedi-lhe a cabeça, o que me deste? a boca. Boca não é cabeça, não que não deseje a boca, desejo! a boca, língua, saliva. Mas cabeça é algo mais vasto, tem cabelos, olhos, nariz, orelhas e boca também, enfim deu-me apenas a boca. Não chega a ser boca, é apenas a arcada dentária. Quando me presenteou, pensei: só falta falar! não falta mais, já fala, diz coisas absurdas, fala sobre os bolinhos de marte, diz que tem um jardim de margaridas anãs, eu lhe falo sobre a Liga dos AnarcoFascitas Cegos, Ela diz que gosta de Alvares de Campos por ser visceral, Eu falo sobre Caeiro pensando em Satie, juntos dançamos pela casa, levo você à janela, juntos olhamos a chuva cair, cai bem fraca, no horizonte parece que o céu evapora sobre a cidade, na Augusta carros descem, sobem. Pessoas caminham retraídas por causa do frio e da chuva fina. Um skat desce a Augusta, sobre o skat um jovem de cabelos longos e braços abertos, seu corpo se curva sobre o skat e ele desce em ziguezague de braços abertos Augusta abaixo, lá embaixo mal se vê a bandeira sobre o prédio do ex-banespa sacudindo ao vento. Eu, aqui encima, com a boca na mão olhando a cidade. Boca não vê, apenas fala, passo o resto da tarde ouvindo a boca falar, cantar, sorrir.

domingo, 23 de agosto de 2009

Cenas de domingo


Eu sobre o viaduto Santa Ifigênia, visão do alto, eles sob o viaduto. Dois túneis batizados de Papa João Paulo II, deles um infinito entra e saí de carros. Eu, visão do alto, vi primeiro um, em seguida o outro, eles agachados, calças arriadas, defecam tranquilamente. Ao meu lado, pai, mãe e filho, o que fazem, pergunta o filho? responde-lhe o sábio pai: "cagam quenem cachorro". Assim pai mãe filho cruzam o viaduto e tronam-se invisíveis na esquina. Eu, do alto, penso no nome dos burrocos: João Paulo II, vejo a mão de um dos que agachado cagava, a mão vasculha entre sacos de plástico, grama e capim, por fim um fino pedaço de algo entre o papel e o pano, sua mão dirije-se ao cu, bruscos movimentos da mão que tenta, de alguma forma, se livar do resto das fezes entre as nádegas. Pronto! feito! calças erguidas, os dois terminam de defecar ao ar livre, numa manhã fria de inverno, em pleno Vale do Anhangabaú, sob o viaduto Santa Ifigência, juntos e caminham em busca do café da manhã. Tocam os sinos do Mosteiro São Bento, penso na hóstia, no cálice de vinho, um sabor acre paira no ar.


Tela de HD Expressionista

Manhã de domingo com chuva



O que saí da sua boca, entra por onde?

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Satieando

Na rosa-dos-ventos uma leve brisa úmida
no céu montalhas compactas de nuvens cinzas
Em circulos crescentes, planam, na brisa, os urubus
Sob a água turva flutuam cisnes brancos negros
Na grama verde, negros urubus bailam como se a ouvissem Satie

Tarde de inverno com chuva


Madame Butterfly

Abri o guardachuva,
Sorri
e um olho quase

quebrou

meu dente!
Ah! e ele, o olho, me repete,
balangando,
que te amo!
E melhor,
É verdade!



Foto: HD Expressionista

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

E o pensamento multicor de Rimbaud


Entrelace de pernas

...........................................Brancas

................Rosa

de mamilos expostos


..................................cabelo cabal

Preto

.............contorna silhueta

...........................Pálida

........................................face
Faz-se fêmea frenética



J. Roberto