segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Uma marina Augusta acima








Subindo a Augusta tentando me livrar dos buracos da calçada, penso em Visconti ao ver Marina tentando esconder-se em si mesma. Quem acredita que marina é um local seguro para atracar seu barco, após noites e noites em alto mar, comete um ledo engano! Pois ainda não conheceram Marina. Bela, branca, baixa. Impossível não notá-la. Sentados à mesa de um café, Marina com olhar fugidio pede café com gestos harmônicos, entre um gole e outro imagino Tadzio em uma praia em Veneza, correndo na areia com seu corpo seminu, sua pele alva, o calor do sol penetrando em seus poros, o suor brotando da pele e correndo pelo corpo. É noite! Não há sol, a praia mais próxima fica a mais de 100km. Marina acende um cigarro, o farol dos carros não guia barco algum, mas ilumina o rosto de Marina a cada instante mais belo, seus lábios vermelhos, finos e pequenos encerram dentes simetricamente perfeitos e brancos, sua língua insiste em brincar fora da boca, acaba presa entre os dentes. Quais palavras iam ser pronunciadas pela língua de Marina? O que seus dentes a impedia de dizer? Com seu All Star preto, pés pequenos, sua calça de veludo vermelho, blusa cinza, despojadamente bela com seu estilo non sense. Seus olhos negros na ausência de luminosidade, e mel quando há luz, sobrancelhas marcantes para seu rosto suave, uma pinta preta do lado direito da face, próximo ao olho, cabelo castanho claro bem curto ao estilo Paris 68, uma madeixa que insiste em cair sobre seu olho direito, ela com a mão direita retira, lentamente, a madeixa sobre o olho - num gesto contemplativo. Continuo seguindo seu olhar na busca de descobrir onde ela se esconde em si. Lá se vai Marina, cruza a Paulista, rumo ao cinema para ver Nova York, Eu Te Amo. Isso não é um filme e não estamos em Nova York e não há amor nas esquinas, penso em Tadzio andando pelos becos de Veneza e dando de cara com os mortos de peste por todo lado. Marina fica como algo onírico fora do tempo e do espaço, desço a Augusta pensando em Caio Fernando tentando se esquivar dos buracos da angustia. Caio logo a frente sorri e me pergunta dos morangos, digo que mofaram e que as marquesas vivem encerradas em apartamentos assistindo ovos serem apunhalados nas esquinas ou, talvez, seja só o leiteiro lá fora. Lembro-me de um diálogo de Morte em Veneza: O belo não se constrói, ele simplesmente existe!
Assim como Marina.



Foto: Marina Arruda
http://www.flickr.com/photos/marinaarruda/